FAZENDA MILANO: da Glória ao fracasso da execução judicial

Segue abaixo importante texto de Jaime Amorim, dirigente do MST, sobre a ocupação da Fazenda Milano em Santa Maria da Boa Vista – PE.

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No ultimo dia 23 de outubro 1.500 famílias ocuparam a fazenda Milano no município de Santa Maria da Boa Vista de mais de 2.200 Hectares de Propriedade de uma empresa do Sr  José Gualberto, que também é vice Prefeito do município. Desde a ocupação, o diretor proprietário  e gerente da Empresa vêm tentando politizar o fato da ocupação, tentando convencer a sociedade de que as famílias acampadas e o MST ocuparam a sua fazenda como uma ação politica eleitoral. Ora, ele sabe como também informamos a prefeita, que a ocupação estava para ser realizada em abril, mas adiamos justamente para não se configurar como uma ação eleitoral ou que pudesse atrapalhar o processo conturbado que foi as eleição suplementar  do município. Lembrando nas eleições de 2012, Gualberto foi candidato a prefeito e foi derrotado, a eleição foi anulada e  em uma nova configuração de alianças partidária, ele foi candidato a vice  da prefeita que venceu as eleições.

A Fazenda Milano, esta localizada as margens da estrada da Reforma Agrária  onde há uma área de concentração de assentamentos as margens do Rio São Francisco. Nesta região algumas fazendas que também já foram importantes, como empresa agropecuária, faliram e foram desapropriadas  e hoje são assentamentos da Reforma Agrária, como: a fazenda Safra da Etti, a Fazenda Varig, da Varig, a fazenda Ouro Verde, dos japonês; a fazenda Catalunha da OAS, a fazenda Brilhante, da agropecuária brilhante entre outras.  Neste processo a fazenda Milano, localizada no centro da estrada da reforma agrária. sempre serviu como base de apoio da reação conservadora contrária à reforma agrária.

Em Agosto de 1995, quando foi realizada a ocupação da fazenda safra, com 2.204, a primeira ocupação desta região e a maior ocupação realizada no estado de Pernambuco, a fazenda Milano contratou um grupo de pistoleiros bem armados e estruturado coordenado, pelo famoso matador muito conhecido na região chamado de “Exú”, para combater as ocupações, e eliminar lideranças do movimento. No entanto a ocupação da Safra foi vitoriosa e  em função do forte conflito na região o INCRA acelerou o processo de desapropriação das fazendas e empresas improdutivas, para assentamentos das famílias acampadas. Hoje na estrada da Reforma Agrária, estão assentadas mais de 2.500 famílias, e Santa Maria da Boa Vista é o município do estado com mais famílias assentadas.
A fazenda Milano já teve sua importância, nos “tempos de glória” do dinheiro fácil  do FINOR, da SUDENE, e das facilidades de financiamento do fundo constitucional do Nordeste gerenciado pelo BNB. Neste período, com as facilidades  de financiamentos públicos, a fazenda Milano viveu a nostalgia de ser uma empresa de ponta, como produtora de uva. O vinho Botticelli era apresentado como resultado da grande riqueza produzida nessa região, a fazenda era tida como “topo de linha” na produção de uva e de vinho, com alta tecnologia, alta produtividade gerando entusiasmo em empresários de outras regiões do Brasil e de outras partes do mundo. A fama da fazenda Milano de um lado abria cada vez mais espaços para novos financiamentos, sempre justificado como inovação tecnológica, e de ser promotora de um novo processo de desenvolvimento da região baseado na fruticultura irrigada, na alta tecnologia que permitia a produção de uva irrigada no semiárido, na monocultura agroexportadora, e na agro industrialização da uva transformada em vinho.
Por outro lado, esta mesma riqueza gerava uma massa de milhares de assalariado que viviam do subemprego promovido pelas empresas agropecuária, como uma excessiva carga horária, trabalhos forçados e expostos a agrotóxicos e adubação química. Esta precariedade do trabalho de uma massa de assalariado rural, em sua grande maioria se concentrava na cidade de Lagoa Grande, Santa Maria e nos bairros pobres de Petrolina, se sujeitando ao trabalho de madrugada à noite, transportado em caminhões precários, levou grande parte desses trabalhadores a lutar pela Reforma Agrária, com uma alternativa de trabalho, de produção, e de vida.
O modelo Milano baseado na alta produtividade no financiamento público e na produção para exportação, com  alta tecnologia e por outro lado  alto custo de produção, principalmente nos quesitos: água, energia elétrica e insumos, somado a isso: A ostentação da riqueza, o mal gerenciamento levou esta fantasia a falência, e consequentemente a ocupação pelos trabalhadores sem terra revindicando sua desapropriação e transformando em assentamento da Reforma Agrária.
Durante a reunião realizada em Recife no dia 07/11/2013, onde estavam presentes três secretários de estado, o superintendente do INCRA, e representante da prefeitura de Santa Maria da Boa Vista e o Movimento Sem Terra, quando duas questões estavam colocadas na mesa como centrais: de um lado, o MST exigia que o INCRA cumprisse o acordo firmado em abril deste ano, de desapropriar a fazenda Milano para fins de Reforma Agrária, e do outro lado o governo do estado tinha em mãos um decreto de reintegração de posse expedido pelo juiz da comarca de Santa Maria da Boa Vista, para ser cumprido. No entanto nenhuma das duas questões foram discutidas, pois, a informação que veio para o centro da negociação foi o processo da justiça federal de execução  da fazenda Milano. Ha um processo final de execução tramitando na justiça federal a pedido da fazenda nacional, por conta de dívidas das empresa com a União Federal.
O fato escancarou o que todos já sabiam, mas que poucos tinham a informação em dados. A  Milano deverá em muito pouco tempo ser executado e abjudicado a favor do INCRA para que possa então criar assentamento da Reforma Agrária. Peritos da justiça federal, consta no processo de execução, avaliaram a fazenda Milano em 12 milhões de reais, no entanto ninguém soube informar na mesa de reunião, o valor atual das dívidas da empresa, dividas com o governo federal, estadual e com o município. Estima-se apenas que as dívidas com bancos públicos INSS e ministério do trabalho ultrapassam a 75 milhões de reais. Portanto, sem contar as dividas com o governo estadual e municipal representa aproximadamente 6 vezes maior que seu capital.
Ao invés do Sr José Gualberto tentar vincular a ocupação da sua fazenda a uma ação política eleitoral e tentar vincular o cancelamento da festa da Uva da cidade de Lagoa Grande a ocupação de sua fazenda, deveria pedir desculpas ao povo de Lagoa Grande, de Santa Maria, e ao povo brasileiro, por tanta incompetência no (gerenciamento) das riquezas produzidas pelo povo  brasileiro.
A fazenda Milano transitou em poucos anos da modernidade da alta tecnologia, da alta produtividade, da manufatura do trabalho assalariado, para um modelo pré-capitalista, ou por que não dizer semifeudalista, tudo para tentar escapar da falência, para burlar as leis trabalhistas e a inadimplência bancaria. Subdividiu a manutenção da produção da uva, entre os seus empregados, utilizando das suas DAPs – Declaração de Aptidão do Trabalhador Rural, para contratar novos financiamentos e ainda cobrar renda da produção agrícola. Viver do arrendamento da terra, para quem vivia arrotando modernidade, e esteve na “ponta” da produção e da produtividade da uva e do vinho, é a exposição de incompetência  e do atraso nas relações trabalhistas.
Pela primeira vez na história mais recente da luta pela terra no Brasil, uma grande propriedade poderá ser destinada para reforma agrária, sem precisar passar pelo longo processo de desapropriação do INCRA. Durante a reunião a questão do despejo das famílias em que sonha o proprietário, não foi discutida, ate por que nossos advogados estão afirmando, que não cabe reintegração de posse em uma área em que o proprietário perdeu o domínio de sua posse e o Fórum local perdeu a competência sob este processo.
O mais importante agora é pensar que na antiga fazenda Milano vai ser criado mais um grande assentamento na estrada da Reforma Agrária, com mais de 200 famílias assentadas e Santa Maria da Boa Vista caminhando a passos largos para ser  um dos municípios com grandes potenciais, para um novo modelo de desenvolvimento de agricultura, baseada da produção de alimentos, na diversificação da produção e na democratização da terra.

Recife,10-11-2013
Jaime amorim
Direção do MST

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