Há tempos um livro não me tocava como tocou Soledad no Recife de Urariano Mota. Tudo bem, o tempo pode ser um exagero, afinal não completaram-se nem 6 meses do último livro de Fausto Wolff que li (O Homem e seu Algoz). Mas não exagero sobre a sensação proporcionada pela leitura.

Poderia esperar mais tempo para digerí-lo melhor, mas não. Preferi compartilhar logo este sentimento, mesmo que caótico.

No livro, o pernambucano Urariano Mota remonta os episódios que antecederam a chacina da Chácara de São Bento (PE), mais um dos crimes da ditadura. Com um detalhe, pelas palavras de Alípio Freire na orelha do livro: “Este, porém, se destaca dos demais: os militantes foram assassinados com participação direta de um ex-companheiro que passara para a repressão e se infiltrara no movimento, José Anselmo dos Santos, o cabo Anselmo. Uma das militantes assassinadas, Soledad Barrett Viedma, a Sol, era sua própria mulher – e estava grávida.”

Mais do que um relato histórico, esta é uma obra ficcional em que Urariano usa e abusa (no bom sentido) da poesia e nos presenteia com uma verdadeira obra de arte. Arte porque é poesia e arte porque é mais um instrumento que nos faz entender e não nos esquecer este período tão sombrio em nossa história.
É um livro triste, é bem verdade, mas não menos que essa mancha, deixada em nosso país, pela ditadura.

Flávio Aguiar na apresentação do livro diz: “Urariano Mota criou uma ficção tão impressionante que parece de verdade. De certo modo é de verdade, porque mobiliza sentimentos, sensações, percepções, culpas, paixões, ódios que foram (e são) poderosos e comuns a todos os que viveram os anos de chumbo, e a eles sobreviveram. É um romance de amor que se passa em tempos contrários ao amor”
Ousaria complementar dizendo que não mobiliza sentimentos e sensações apenas nos que viveram os anos de chumbo. Nos que não viveram também, mas que têm um mínimo de humanidade e solidariedade.

Sei que a estas alturas, a web deve estar repleta de análises sobre Soledad no Recife. Mas é até bom, pois grande parte foram produzidas por críticos literários de verdade. Minha intenção aqui foi apenas compartilhar, como falei, e recomendar a leitura!

3 comentários

  1. Muito obrigado, Doutor Alexandre. A sua leitura não é mais uma. Faz parte da corrente para a humanidade. Médico socialista, que ama a literatura, é que é o verdadeiro médico. Abraço fraterno.

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